Greve geral: trabalhadores contra a reforma da Previdência

Greve geral: trabalhadores contra a reforma da Previdência

Produção: Alessandra Alves Dias, Angela Bueno, Briann Ziarescki Moreira, Jaine Rodrigues e Rafael Chiamenti Pedroso/Acin Jornalismo

Na sexta-feira, 14 de junho de 2019, estudantes do curso de Jornalismo da Unochapecó realizaram a cobertura da Greve Geral contra a reforma da Previdência. Eles conversaram com diferentes personagens que relataram um pouco de sua história e os motivos que os levaram a se manifestar. Cartazes, bandeiras e olhares de esperança se destacavam em meio a multidão. Cada personagem tinha suas próprias características, mas três aspectos chamavam a atenção: a  experiência, a inspiração e a militância. Acompanhe as conversas com as trabalhadoras e trabalhadores.

Sirlir e Vera Scussiato

As irmãs Sirlir e Vera Scussiato têm no pai (in memorian) a referência de militância (Foto: Rafael Chiamenti Pedroso)

Eram quase cinco horas da tarde. Poucas pessoas ainda estavam na praça Coronel Ernesto Bertaso, a principal de Chapecó. Nem parecia que algumas horas atrás, quase duas mil pessoas gritavam palavras de ordem contra a proposta de Reforma da Previdência do governo atual. As pessoas que permaneceram formavam rodas de conversa. Sempre com a cuia na mão, ouviam lideranças sindicalistas sobre os perigos da chamada “deforma” da previdência. Duas mulheres risonhas, sentadas juntas em um dos bancos da praça, chamaram a atenção por estarem envoltas em bandeiras de um determinado partido político. Nos aproximamos e puxamos conversa com as simpáticas senhoras Sirlir e Vera Scussiato, irmãs de 63 e 62 anos respectivamente. Moradoras de Chapecó, viveram recentemente a perda do pai, um homem descrito por Sirlir como romântico e militante. Rovílio Antônio Scussiato, fundador do Partido dos Trabalhadores, da Cooperalfa e do Sindicato dos Trabalhadores Rurais em Chapecó, inspirou as filhas a seguir o caminho da militância. “Por tantos motivos, eu já nasci esquerda. Meu pai me fez perfeita, o coração tá do lado esquerdo, o meu sangue é bem vermelho e ainda sou colorada, não me falta nada pra ser feliz”, afirma Sirlir rindo à toa. Quando perguntamos qual a sua opinião sobre a reforma da Previdência, ela diz que vai prejudicar todos os trabalhadores, de todas as classes sociais. Vera, que é artesã e uma das fundadoras do grupo de deficientes físicos de Chapecó, mostra empolgada seu bordado. Ela saiu do seu trabalho para ir até a praça manifestar a indignação contra as injustiças do Brasil. “Infelizmente o que eu tenho pra dizer é que essas leis falam tanto de ajudar os deficientes e quando a gente vai renovar a carteirinha pra andar de lotação, por exemplo, me disseram assim, ‘porque a senhora não faz a carteirinha de aposentada que é mais fácil de fazer do que a de deficiente?’. E eu disse então: o que vocês estão fazendo pelos deficientes? Só tão aparecendo”, relata. Depois de tantas histórias, partimos deixando as irmãs rindo e conversando no fim da tarde.

Neri Damos

O médico veterinário aposentado, Neri Damos, relata a importância da educação (Foto: Angela Bueno)

Chegamos na praça Coronel Ernesto Bertaso com o sol já se despedindo. Estávamos cansadas da correria que havia sido o dia até então. A Greve Geral reuniu milhares de pessoas no centro de Chapecó às 9h da manhã. Após falas de sindicalistas, professores e manifestantes desceram em caminhada pela Avenida Getúlio Vargas até o calçadão da Rua Benjamin Constant. Naquele fim de tarde, uma figura se destacava em meio as pessoas que permaneciam na praça. Um senhor e seu cartaz faziam-se proeminentes. Formado em Medicina Veterinária em 1973, Neri Damos estava com sua esposa no local militando contra a proposta de Reforma da Previdência e os cortes de verbas destinadas à educação.  Neri trazia em seu cartaz um recado direto ao ministro da Educação: “Sabem por que estou aqui? Porque tive pais nascidos em 1915, que sempre me incentivaram a estudar. Hoje, em 2019, elegem esse tipo de gente que quer trocar livros por armas. Senhor Ministro da ‘inducassão’, sou pai e avô, e estou esperando você vir desautorizar-me a incentivar alunos e professores fazerem manifestações contra essas barbaridades que este governo está fazendo com a educação brasileira. Talvez, mande milicianos, porque de armas este governo entende”. Seus pais, sempre foram analfabetos e assim, dispunham de pouco acesso à educação. Entretanto, sempre incentivaram e apoiaram que seus cinco filhos tivessem acesso à educação. Assim, em universidades federais, formaram-se três engenheiros, um veterinário e um economista; mostrando que com apoio e incentivo, seus filhos ascenderam na vida e na profissão. Neri, sempre com um sorriso estampado no rosto, se emocionou ao contar a alegria dos jovens que leram seu cartaz.  “Meu senhor você deixou nosso dia mais lindo”, disseram. O senhor de 70 anos segurou as lágrimas e nos brindou com seu conhecimento, sua experiência, militância e acima de tudo, com seu olhar humano diante de todos os descasos que as classes sociais vem enfrentando.

Cristiane Borella

A professora Cristiane Borella atua há 14 anos nas redes de ensino municipal e estadual (Foto: Alessandra Alves Dias)

Depois de uma manhã de muitas falas e estudos em relação a reforma da Previdência na praça Coronel Ernesto Bertaso, uma parcela dos manifestantes partiu, no início da tarde, rumo a BRF – Brasil Foods, uma das maiores agroindústrias do município. Em meio a falas, músicas e sons, nos aproximamos de uma mulher que estava participando do ato na Avenida Senador Atílio Fontana. Na conversa, Cristiane Borella, 39 anos, nos contou que aderiu a greve porque está na luta desde criança junto com seu pai e que agora quer passar esse exemplo para sua filha de sete anos que já a acompanhou em algumas outras manifestações. Cristiane segue os passos do pai. Filha de professor,  atua há 14 anos na rede estadual e municipal. O pai, com 73 anos, ainda luta pelo que acredita. Ela conta empolgada que encontrou na manifestação vários de seus alunos que vieram abraçá-la. “Acredito que eu seja exemplo para meus alunos e isso me orgulha muito por que vemos que estamos no caminho certo. Acho que tem que ser feita uma reforma, mas que inclua militares, judiciário e políticos não somente a classe trabalhadora. Por isso estou aqui”, frisa. Cristiane conta que emocionou-se ao encontrar e conversar com a Zoia Prestes, filha de Luiz Carlos Prestes, na greve. “Esta manifestação de hoje estará nos livros de história que minha filha e os filhos de vocês irão estudar no futuro. E eu vou estar com certeza no lado certo” finaliza.

Maria Flach

A aposentada Maria Flach participou do ato contra a reforma da Previdência (Foto: Alessandra Alves Dias)

A tarde de sexta-feira, 14 de junho, fazia muito calor, há uma semana do início oficial do inverno o dia parecia contrariar a estação.  Em meio a vários trabalhadores, aposentados e estudantes, uma senhora sorria ao som da música que tornou-se hino dos movimentos de esquerda “Pra não dizer que não falei das flores”,de Geraldo Vandré. Maria Flach, de 66 anos, é aposentada e veio do município de Quilombo para participar da Greve Geral. Ela tem esclerose sistêmica e recentemente passou por uma cirurgia de alto risco. Mesmo em recuperação, ela buscou forças para estar presente neste dia histórico para expressar sua contrariedade à Reforma da Previdência. Maria sempre participa dos movimentos. Quando perguntamos sobre porque aderiu a greve ela nos disse: “Eu vejo que para a futura geração isso é um retrocesso, se não fazemos greve é tirado nossos direitos”. Maria foi uma das fundadoras da Rádio Comunitária de Quilombo “A Voz do Povo” que tem anos de existência.

Victor Borges Pereira

O estudante de Engenharia de Controle de Automação do IFSC e monitor de laboratório de Informática (Foto: Angela Bueno)

“Contra a reforma da Previdência que deforma o presente e nos rouba o futuro. Somos resistência!”. Com o cartaz nas mãos e um sorriso no rosto, encontramos Victor Borges Pereira. O estudante do Instituto Federal de Santa Catarina, de 19 anos, estava na mobilização em frente à BRF no início da tarde de sexta-feira. Em meio as pessoas que estavam no ato, o jovem manifestava o porquê aderiu a greve, destacando que se aprovada a reforma da Previdência irá atingir todos os trabalhadores, mas especialmente a sua geração. “Nós, jovens de hoje, iremos ser os mais afetados, nós que estamos ingressando no mercado de trabalho”, disse. Durante nossa conversa o estudante comentou ainda a sua contrariedade ao presidente eleito. “Também estou aqui para dizer ‘Não, Bolsonaro’”, frisa. Após nossa conversa seguimos em busca de novos personagens enquanto Victor permaneceu no ato manifestando sua opinião e apoiando a Greve Geral.

 

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