Por Rafael Chiamenti Pedroso*
De repente, em um estalar de dedos, o mundo foi engolido por um vírus invisível e de certa forma brutal. E não havia fronteiras para ele. A situação forçou inúmeras pessoas a se trancar em casa, como forma para conter o vírus. O lar passou a ter dupla função, agora como local de trabalho. Sem poder socializar, foi preciso preencher a lacuna do tempo livre. Alguns recorreram à leitura e outros buscaram o acalento da escrita, em pôr no papel sentimentos e momentos de uma pandemia.
O momento foi propício para um jornalista e um médico tirarem uma ideia do papel e organizar um livro. Em meados de março de 2020, foi pensado a ideia de reunir em uma coletânea literária, a vivência da pandemia do coronavírus. Com 202 páginas, a obra expõe histórias diferentes: o luto de um ente perdido, os devaneios de uma quarentena, a reviravolta da vida, as rotinas de estudantes e professores, e toda a mudança decorrente da pandemia.
Bueno, escrevendo registro de uma história
Paulo Juarez Braga, jornalista que reside em Três Passos, noroeste do RS, é envolvido na área da cultura da cidade. Por consequência da pandemia, ele acabou parando a gravação de um documentário que estava em produção, e assim surgiu Pandemia Literária. “Perguntei se o Nelson (Brauwers) topava me ajudar a organizar um livro sobre textos e relatos pessoais de como cada um, do seu isolamento, estavam lidando com a questão do coronavírus.”
Os dois começaram convidar escritores ou conhecidos. E, pouco a pouco, os textos passaram a chegar às mãos dos organizadores, Brauwers e Braga, dando forma ao livro, processo que levou seis meses.
Na obra, a pluralidade de vozes é uma das marcas. É possível encontrar trabalhos de escritores do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, mas também da Argentina. São poemas, textos literários, poesias e reflexões críticas.
Além de organizadores, Brauwers e Braga também participam do livro em forma de palavras. O primeiro escreveu Depois, O Amor nos tempos do Coronavírus, Os Melancólicos e o Semeador de Mortes. O jornalista, por sua vez, trouxe relatos pessoais no livro. Um deles, é o texto Dois Cunhados, Uma Doença e Duas Viúvas, onde relata o período em que suas duas irmãs perderam seus maridos, numa pequena diferença de meses. Abraços também é um relato pessoal, de onde se despediu de um amigo no aeroporto, e depois não viu-o mais. Outra convidada, foi a sobrinha de Braga, Giovana Marcolan Zamberlan, que aborda sua rotina de estudo frente à pandemia. Foi desenvolvido na aula de espanhol que cursa, e após seu tio tomar conhecimento, pediu para que publicasse em espanhol e português.
A escritora Mariana Lima foi convidada em abril de 2020 e topou na hora, entregando o texto no dia seguinte ao convite de participação. É dela o capítulo Caminhos Desconhecidos, que fala sobre incertezas, da volta para a casa da mãe após dois anos vivendo em Santa Maria-RS, e do processo de adaptação ao ensino a distância do cursinho, além, é claro, de sua rotina. O processo de inspiração foi improvável, mas natural, como abre seu texto com uma poesia de Cecília Meireles.
“Era como uma oração. E ao pensar em tudo que estava acontecendo, a palavra que mais marcava a situação era medo, seguida de morte e para aqueles que tinham esperança: renascimento.”
O livro ainda não foi lançado de maneira presencial, oficialmente, devido às restrições do coronavírus. Porém, alguns exemplares já estão circulando por iniciativa dos escritores e familiares. Braga comenta que um evento para lançamento oficial está sendo programado assim que a pandemia for diminuindo e os eventos possam voltar a ter aglomerações. Pandemia Literária é uma obra descompromissada na sua forma, mas comprometida com a verdade dos fatos e relatos, como diz Braga.
(*) Com orientação do professor Hygino Vasconcellos