‘Que amanhã não seja só um ontem’ é tema da 5ª Parada LGBTQIA+ do Oeste

‘Que amanhã não seja só um ontem’ é tema da 5ª Parada LGBTQIA+ do Oeste
Por: Anna Luisa Schuck e
Schaiane Cristina Bohn

“Tenho sangrado demais. Tenho chorado pra cachorro. Ano passado eu morri. Mas esse ano eu não morro”. (Sujeito de Sorte, Belchior). Com essa música que se inicia mais uma de várias histórias da luta LGBTQIA +. Em 28 de junho de 1969, um marco se tornaria símbolo do principal movimento pelos direitos LGBT+ do mundo. Tudo ocorreu no vilarejo de Greenwich, localizado em Nova York, onde um grupo de frequentadores do Stonewall Inn, bar gay daquela época, resolveram acabar com a perseguição policial e dar um fim na violência que os perseguia há anos. 

Enquanto isso, no Brasil, o regime militar (1964 a 1985) ainda estava ativo, e a perseguição, censura e silenciamento contra a comunidade LGBT+, era extremamente forte, em especial no estado de São Paulo. Em 19 de agosto de 1983, outra história foi marcada e ficou conhecida como o “Stonewall brasileiro”, onde membros do Grupo Ação Lésbica Feminista (Galf), se revoltaram contra o dono do Ferros Bar, e protestaram em frente ao estabelecimento, dando origem também à data em que hoje celebra-se o Dia do Orgulho Lésbico.

A primeira Parada do Orgulho LGBT+ (à época chamada apenas “Orgulho Gay”) ocorreu em 1997, na Avenida Paulista, região central de São Paulo, e contou com pouco mais de duas mil pessoas. Já em Santa Catarina, a primeira Parada do Orgulho Gay ocorreu na capital, Florianópolis, em 1999, e chegou no Oeste Catarinense, mais precisamente em Chapecó, no ano de 2016. 

2016
UNA Chapecó 
2019
Créditos: Rafael Chiamenti Pedroso

1, 2, 3, 4…

Parada… 2020 e 2021, a multidão que descia a  Avenida Getúlio Vargas nos outros anos estava em casa, não por motivos bons, mas sim pelo vírus que chocou o Brasil e o mundo, causando a Covid-19. A Parada do reencontro foi agora, em 2022, no domingo 26 de junho. A 5ª Parada de Luta LGBTQIA+ do Oeste Catarinense, ‘que amanhã não seja só um ontem’, retornou e trouxe mais vidas às ruas de Chapecó. 

Carol Listone, presidenta da UNA LGBT, e uma das organizadoras da parada de Chapecó, relata que foi emocionante estar de volta à rua e ver a praça cheia de famílias, mães e pessoas reunidas após a pandemia. “Foram dois anos muito doloridos pra gente não só pelas perdas da Covid-19, mas também pelo grande retrocesso que o Brasil está sofrendo. Hoje nós queremos falar de esperança e de vitória aqui nessa praça.” Carol também comenta que ser parte da comunidade LGBTQIA+ no município de Chapecó é um ato de resistência devido ao forte conservadorismo presente na sociedade. “É resistência, sempre vai ser, ser LGBT em Chapecó é resistência, ser uma família LGBT é resistência. Mas hoje, mais do que nunca. É importante dizer que a gente resiste com amor, isso é o mais importante”, destaca.

Carol Listone
Crédito: Isadora Zanluchi

“Não dá pra lembrar da gente só em momentos importantes, nós precisamos pautar a política, a pauta LGBT é nossa”.

Carol Listone

Na abertura do ato político, Liliane Araújo destacou a vulnerabilidade das pessoas da comunidade LGTBQIA+ durante a pandemia, também criticou a falta de dados sobre óbitos dentro da comunidade. “A gente não consegue dados, porque a gente morre feito bicho sem nada ser relacionado. É como se a morte violenta da gente não tivesse nada a ver com quem a gente é, não tivesse nada a ver com quem amamos ou com quem somos”, afirmou. Ela reforçou que a luta é para que isso acabe um dia e as pessoas tenham mais oportunidades de trabalho, de estudo, de demonstrar e desenvolver seus talentos. 

Liliane Araújo
Crédito: Christopher Marin

Dos mais variados relatos, o da professora da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), Rubí García, trouxe aspectos da força dentro da comunidade. “Penso que não é só o momento para festejar, também é um momento de luta. Mas a tristeza a gente espanta pulando, sorrindo, beijando, ficando juntes. Pra mim é muito bom, muito importante estar aqui de novo, poder celebrar e comemorar esse tempo que passa”, pontua.

Rubí García
Crédito: Christopher Marin

De longe para a parada

Após dois anos sem ir para a rua, por conta da pandemia, na parada deste ano, estiveram presentes algumas caravanas organizadas vindas de Herval D’Oeste, Joaçaba, Caçador, Xanxerê, Xaxim, Concórdia, Maravilha, Pinhalzinho, São Lourenço do Oeste e Erechim/RS.  

A alegria de estar de volta às ruas, lutar pelos seus direitos e comemorar sua existência, motivou os três amigos, Jhonatan de Souza, Luighy Chaves e Carol Marino a viajarem 226 quilômetros de Caçador até Chapecó para participar desse momento. “É uma emoção enorme estar aqui hoje. Tenho trinta anos e estar numa parada pela primeira vez é muito emocionante. Tô com o coração a mil”, relatou Luighy. 

Carol Marino, destaca que pra ela a UNA é ela mesma, independente do local onde esteja, sempre vai estar na UNA. Ela conta que foi uma luta e uma conquista estarem presentes na parada com uma caravana vinda de Caçador. “Nós estamos em torno de 20 pessoas. Para nós foi uma batalha, até pra alugar um ônibus, porque há bastante preconceito”, relata.

Jhonatan de Souza, Luighy Chaves e Carol Marino
Crédito: Isadora Lawall

Flávia Pacchely, que também veio de outra cidade, viajou 167 quilômetros, de Herval D’Oeste até Chapecó, para performar na parada. Nascida em Porto Alegre, ela mora em Herval há 22 anos. Trabalhou como transformista durante 15 anos, em casas noturnas fazendo shows e espetáculos. Ela conta que veio pela primeira vez na parada em 2016. “O trabalho artístico é a nossa militância, para mostrar a nossa visibilidade, nosso trabalho. Mostrar para as pessoas que nós somos Drag Queens, que nos apresentamos em qualquer estabelecimento. Para que as pessoas saibam dar valor. Nós somos seres humanos”, destaca. Flávia também relata que preparou a música e o figurino todo colorido especialmente para o evento. 

Flávia Pacchely
Crédito: Christopher Marin

Mães na parada

Uma das primeiras falas da parada do dia 26 foi feita por  Marli Campos, que representou a ONG Mães pela Diversidade, criada há 15 anos, com o intuito de trocar experiências vivenciadas e acolher mães, pais, filhas e filhos da comunidade LGBTQIA +. “Quando o Carlos [filho] veio me falar, eu fiquei um pouco perdida e eu procurei ajuda delas e hoje eu tô aqui defendendo o meu filho e o filho de todas”, relata. Carlos Eduardo Linhares Caetano, carinhosamente chamado de Cadu pela mãe, dona Marli, conta que se emocionou muito ao ouvir o discurso da mãe em cima do trio para todas as pessoas presentes. “Se eu não tivesse o apoio da minha mãe eu não iria conseguir levantar da cama de manhã, não iria conseguir ir pra aula e trabalhar sem saber que ela tá ali por  mim”, comenta. 

Outra mãe que se fez presente na parada foi Bernadete Rogoski, que participou de todas as edições realizadas em Chapecó, apesar do seu filho atualmente morar em Florianópolis. Ela se faz presente no movimento para apoiar as pessoas presentes. “Eu estou aqui porque eu apoio, eu acho uma coisa muito especial. Meu filho faz parte da comunidade e eu faço muita questão e o apoio muito”, relata. 

Bernadete Rogoski
Crédito: Anna Luisa Schuck

Estagiárias da Acin Jornalismo, sob supervisão de Eliane Taffarel

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